domingo, 10 de julho de 2016

OS MORTOS QUE O BRASIL NÃO CHORA ( I )

Alberto Mendes Júnior, 10/05/1970, Tenente da Polícia Militar de São Paulo

Em maio de 1970 as autoridades brasileiras não tinham mais dúvidas que o ex-capitão Carlos Lamarca estava atuando no Vale do Ribeira, em São Paulo, onde havia instalado um foco de guerrilha rural. Diversas operações estavam sendo realizadas naquela região, especialmente nas redondezas da cidade de Registro – SP.
Na noite de 08/05/1970, o Tenente da Polícia Militar de São Paulo Alberto Mendes Júnior, que comandava um pelotão sediado em Registro - SP em apoio às tropas do Exército, recebeu ordens de se deslocar até a cidade de Eldorado – SP, onde um grupo de terroristas havia assaltado um posto de gasolina e roubado um caminhão. Tendo passado por Eldorado -SP e não tendo sido feito contato com os terroristas, o Tenente Mendes resolveu seguir até a cidade de Sete Barras – SP. A cinco quilômetros da cidade, os policiais encontraram um veiculo civil atravessado na estrada impedindo a sua progressão. As duas viaturas policiais se aproximaram do veículo e quando estavam a dez metros foram alvejados por disparos de fuzis automáticos. O Sargento Lino e os soldados Carrara e Lareno foram feridos e ficaram caídos no meio da estrada. Outros dois policiais também foram baleados. O Tenente Mendes respondeu ao fogo dos terroristas agrupando em torno de si alguns soldados, no lado direito da estrada. Mas, os terroristas, que também se espalharam pelo mato ao redor da estrada estavam em posição vantajosa. O comandante do grupo guerrilheiro, o ex-capitão Carlos Lamarca exigiu a rendição dos policiais, exigindo que o comandante dos militares se apresentasse, sendo seguido neste intento por Yoshitame Fujimore que bradava que se os soldados não cessassem o fogo iria matar os feridos que estavam na estrada.
Os soldados, armados com velhos fuzis Mauser modelo 1908 não conseguiram fazer frente aos disparos dos terroristas/guerrilheiros que estavam armados com FAL – Fuzil Automático Leve – armas de guerra que haviam sido roubadas do 4º Regimento em Quitaúna pelo ex-capitão Carlos Lamarca.

Nas operações contra guerrilheiros existe a ordem de o comandante nunca se apresentar como tal, tendo em vista o evidente risco pessoal para o mesmo. Entretanto, o Sargento Lima, que integrava a patrulha, julgando que seu comandante Tenente Mendes estava morto, apresentou-se como o comandante. Com diversos soldados feridos na refrega e como a munição estava acabando, o Tenente Mendes, preocupado em salvar seus homens, e mesmo já estando com um ferimento leve no pé, apresentou-se como o real comandante e aceitou o cessar fogo, entregando-se como refém em troca de vida de seus soldados. Ficou combinado então que o Tenente Mendes levaria os feridos para atendimento médico, deixando o restante do pelotão (sete soldados) como refém, e deveria retornar depois para que seus homens fossem liberados. Mendes cumpriu a sua promessa: mesmo já estando livre, retornou ao local do combate e com isso salvou a vida dos seus sete comandados, além daqueles que já haviam sido encaminhados para socorro médico, três dos quais em estado grave.

O grupo terrorista comandado por Lamarca liberou os soldados que haviam ficado aprisionados e prosseguiu a sua fuga levando consigo o comandante do pelotão. Mas, dois dias depois, temerosos que o Tenente Mendes que fora levado como refém pudesse fugir e denunciar a sua posição, resolveram montar um “tribunal revolucionário” e julgar o Tenente Mendes. Tais tribunais eram na verdade uma farsa: o “acusado” não tinha direito a palavra nem a defesa. E a sentença já era conhecida por todos os que participavam de tal “teatro”. Mendes foi condenado a morte pelo grupo e foi amarrado e cruelmente executado a golpes de coronhadas na cabeça. Os terroristas resolveram executá-lo dessa forma para não fazer barulho (com disparos de arma de fogo) e denunciar a sua posição. Morto o Tenente Mendes o grupo prosseguiu a sua fuga, abandonando o cadáver em uma cova rasa.

O corpo do Tenente Alberto Mendes Júnior só foi encontrado no dia 09/09/1970 por um grupo de policiais militares, após a prisão de um terrorista que atuava no Vale do Ribeira. Este elemento informou a localização aproximada do corpo do oficial, que foi encontrado em uma cova rasa, em um local ermo do município de Sete Barras, a cerca de 20 km da cidade de Registro – SP. Foram necessários mais de 36 horas de buscas até que o corpo do Tenente Mendes fosse encontrado. O exame cadavérico confirmou a crueldade com que o oficial da PMSP fora executado, a coronhadas, que esmagou seu cérebro.

Alberto Mendes Júnior era 2º Tenente da Polícia Militar de São Paulo. Era natural de São Paulo e tinha 23 anos quando foi barbaramente assassinado. Era filho de D. Angelina Mendes e Alberto Mendes. Foi promovido postumamente por bravura ao posto de 1º Tenente (alguns periódicos informaram que a promoção fora ao posto de Capitão). Seu corpo foi sepultado em 11/09/1970, no Cemitério do Araça, São Paulo – SP, com honras militares, na presença de cerca de 20 mil pessoas. Os jornais da época, unanimemente, classificaram o Tenente Mendes como verdadeiro herói, tendo em vista o seu sacrifício para salvar seus homens.

Autoria: Carlos Lamarca, Yoshitame Fujimore e Diógenes Sobrosa de Souza compuseram o “Tribunal Revolucionário” que condenou a morte o Tenente Alberto Mendes Júnior. Yoshitame Fujimore e Diógenes Sobrosa de Souza foram os executores da “sentença”.

Fontes: Jornal do Brasil, edição 00134 de 10/09/1970, 1º caderno, página 4; edição 00135 de 11/09/1970, 1º caderno, página 20; edição 00139 de 16/09/1970, 1º caderno, página 23; edição 00140 de 17/09/1970, 1º caderno, página 17; Diário da Noite, edição 13735 de 11/09/1970, matéria de capa; Correio da Manhã, edição 23749 de 16/09/1970, 1º caderno, página 12.

Esclarecimento do autor: este artigo integra uma série intitulada “Os Mortos Que o Brasil Não Chora” e é resultado de minuciosa pesquisa em jornais, revistas e periódicos publicados na época em que os fatos aconteceram. São aproximadamente 120 vítimas. Alguns eram integrantes de Forças de Segurança, outros civis – alguns sem qualquer conexão com um ou outro lado – e os demais eram membros da esquerda que foram “justiçados” (executados) por seus próprios companheiros. A cada publicação contarei a história de um episódio ou de uma vítima. Procurei obedecer a ordem cronológica dos acontecimentos. 

Todos os artigos já publicados estão disponíveis no site do grupo Ternuma (www.ternuma.com.br) e na página pessoal do autor no Facebook (https://www.facebook.com/robson.meroladecampos).

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